Especialista aponta nove ilegalidades na decisão de Moraes que suspendeu a plataforma Rumble no Brasil
Na última sexta-feira (21), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão do funcionamento da plataforma Rumble no Brasil. A medida foi tomada após a empresa se recusar a cumprir ordens da Corte, incluindo a remoção de perfis e a indicação de um representante legal no país. A decisão gerou polêmica, e o advogado constitucionalista André Marsiglia apontou nove ilegalidades no ato do ministro.
De acordo com Marsiglia, a primeira ilegalidade ocorre na origem da decisão: o descumprimento de uma ordem para impedir que o jornalista Allan dos Santos mantenha um perfil na plataforma. O advogado argumenta que tal determinação fere diretamente a liberdade de expressão do usuário.
A segunda e terceira ilegalidades residem na própria essência da ordem judicial. Bloquear um perfil caracteriza censura prévia, enquanto impedir a criação de um novo canal configura censura em hipótese. Ambas as condutas são vedadas pela Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, já julgada pelo STF.
A quarta ilegalidade apontada refere-se ao procedimento de intimação. Moraes alegou que a empresa foi intimada via seu advogado para bloquear o perfil e indicar um representante no Brasil. No entanto, a Súmula 410 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) exige que tais obrigações sejam cumpridas diretamente pela parte envolvida, e não através de advogados. Além disso, se a empresa não possui representação no Brasil, deveria ter sido expedida uma carta rogatória para os Estados Unidos.
A quinta irregularidade decorre do argumento de Moraes sobre o desrespeito à soberania nacional pelo não cumprimento das ordens judiciais. Entretanto, Marsiglia ressalta que as ordens não seguiram os trâmites legais adequados, o que as torna nulas de pleno direito. Sem ordens válidas, não há descumprimento a ser questionado.
A sexta ilegalidade se baseia na natureza das plataformas digitais. Segundo Marsiglia, ainda que sejam empresas privadas, exercem uma função pública essencial ao garantir a liberdade de expressão de milhares de usuários. Dessa forma, a suspensão total da plataforma só poderia ser determinada em última instância e após esgotadas todas as outras medidas legais disponíveis.
A sétima ilegalidade ocorre na caracterização de crime de desobediência atribuído à Rumble. O ministro Moraes alegou que a empresa cometeu tal crime ao se recusar a cumprir a decisão judicial. No entanto, conforme Marsiglia esclarece, o crime de desobediência só existe quando não há uma sanção específica prevista para o descumprimento. No caso, o artigo 774, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC) determina que o não cumprimento da ordem judicial deve resultar em multa, e não na suspensão do serviço.
A oitava ilegalidade levantada refere-se à justificativa de Moraes para reforçar sua decisão. O ministro argumentou que a Rumble incita ódio contra o STF, motivo pelo qual sua suspensão se faria necessária. O advogado destaca que não existe tipificação penal para crime de “incitação de ódio” contra um ente imaterial como uma Corte de Justiça.
Por fim, a nona ilegalidade reside na forma como a suspensão da plataforma foi imposta. O ministro determinou que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fosse intimada para bloquear a Rumble por meio de e-mail. Entretanto, Marsiglia ressalta que tal medida configura uma obrigação de fazer, o que, conforme demonstrado anteriormente, requer um procedimento legal específico e formal para ser válido.
Repercussão da decisão
A suspensão da Rumble gerou diversas reações, tanto no meio jurídico quanto entre os usuários da plataforma. Defensores da liberdade de expressão criticam a decisão do STF, apontando-a como um precedente perigoso para a censura digital no país. Já apoiadores da medida argumentam que a regulamentação de plataformas estrangeiras é essencial para garantir a soberania nacional e o cumprimento das leis brasileiras.