Queimadas no AM cresce mais de 50% no 1º semestre de 2020
Manaus – O Amazonas registrou um aumento de 51,7% na quantidade de focos de queimada nos seis primeiros meses de 2020, em comparação com o mesmo período do ano passado, conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Os números apontam que o quantitativo de queimadas no primeiro semestre deste ano atingiu o recorde dos últimos quatro anos no Amazonas.
De janeiro a junho de 2020 foi contabilizado 496 focos de incêndio em área florestal no Amazonas. No mesmo período do ano passado, foram registrados 327 focos de queimadas. Nos seis primeiros meses de 2017, foram contabilizados pelo órgão 250 focos. Em 2018, entre janeiro e junho, o total de focos de queimadas no Amazonas foi de 475.
O mês de junho deste ano registrou um dos índices mais altos de queimadas na Amazônia, com 2.248 focos ativos, marcando um aumento de 19,5%. De acordo com o Inpe, no mesmo período do ano passado foram registrados 1.880 focos. Esse é o maior registro feito para o mês desde 2007. A região amazônica compreende os estados do Amazonas, Acre, Pará, Amapá, Roraima, Rondônia, Tocantins, Mato Grosso e parte do Maranhão.
O aumento das queimadas acontece por diversas razões, sendo o desmatamento a principal delas. Segundo o sistema Deter-B, que monitora a degradação florestal da Amazônia e de outros biomas, no primeiro semestre de 2020 foi registrada uma área de 3.069,57 km² em alerta de desmatamento na região, 25% a mais que o mesmo período do ano passado. Só em junho, ficou registrada uma área de 1.034,4 km², maior número desde 2015.
“As queimadas aumentam por várias razões. Uma é que o desmatamento está aumentando, com as áreas desmatadas em todos os meses deste ano sendo maiores que nos mesmos meses do ano passado. Isto significa que os desmatadores vão queimar mais, pois o uso do fogo é a maneira mais barata e prática para preparar as áreas desmatadas para plantar. Também há queimadas para manter as áreas já abertas (principalmente de pastagem), e essas áreas são cada vez maiores”, explica Philip Fearnside, biólogo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA).
Além disso, o biólogo afirma que “há o efeito da operação do Exército no ano passado, quando uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) foi emitida proibindo queimadas, deixando áreas recém-desmatadas sem queimar. Quem desmatou essas áreas vai querer queimar este ano, para não perder o investimento na derrubada”.
Para Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), é necessário que a atenção das operações, que atuam contra a devastação da região amazônica, seja voltada à raiz das queimadas, que é o desmatamento. “O importante não seria reduzir só as queimadas, mas o desmatamento em si. As queimadas são o último estágio do processo de desmatamento, se tem desmatamento tem fogo porque se não é dinheiro jogado fora, daquela pessoa que desmatou”.
Políticas públicas enfraquecidas
Em agosto de 2019, o governo federal anunciou a operação Garantia da Lei e da Ordem (GLO), para tentar conter o avanço das queimadas na floresta amazônica. A chegada de militares na região foi uma resposta do presidente Jair Bolsonaro à pressão nacional e internacional que sofreu para agir no combate à devastação da região. As Forças Armadas agiram no combate aos focos de queimadas e ao desmatamento durante 60 dias.
Em fevereiro deste ano, foi retomado o Conselho da Amazônia, comandado pelo vice-presidente da república, Hamilton Mourão, e com quatro comissões. Criado em 1995, o Conselho retornou agora sem a presença dos governadores da região amazônica, dos representantes do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA) e da Fundação Nacional do Índio (Funai), sendo os dois últimos órgãos responsáveis pela preservação e fiscalização de atividades ilícitas na Amazônia, como a devastação de grandes áreas. O Conselho estabeleceu ações genéricas como coordenar e fazer o acompanhamento de políticas públicas relacionadas à Amazônia Legal.
Em maio deste ano, foi implementada a Operação Verde Brasil 2, espelho das atividades realizadas no ano passado. Ane Alencar diz que as atividades feitas até agora não estão sendo eficazes, de modo geral. “Até onde a gente consegue entender, não tem um plano estratégico, as ações não parecem estar bem articuladas. Já fazem dois meses que o exército está na Amazônia e o desmatamento ainda não reduziu, então se tem um plano a gente não sabe e ele não está surtindo efeito”, conta.
“Governo despreocupado”
O biólogo Philip também acredita que apenas a atuação militar não é capaz de combater o problema de forma eficaz. Para ele, “Não adianta apenas colocar o exército para cuidar do problema ambiental. O governo precisa reconstruir tudo que foi desmontado na área ambiental e depois fortalecer esta área mais ainda. Além de reprimir o desmatamento e as queimadas, também precisa parar as muitas ações das diversas partes do governo que levam a mais destruição na Amazônia”.
Para Helso do Carmo, cientista político e professor, o governo federal sempre se mostrou despreocupado com as políticas ambientais, não adotando nenhuma medida efetiva. “Ele [o presidente] toma posse e nomeia evidentemente o ministro Ricardo Sales, um dos ministros mais questionáveis do ponto de vista da preservação ambiental, e assim começa a enfraquecer órgãos como IBAMA, ICMBio, Funai, ou seja, a desqualificar a atuação desses organismos”.
Em entrevista coletiva no último dia 15 deste mês, Mourão afirmou que as atividades da GLO podem seguir, se necessário, até o final da atual gestão. Além disso, o vice-presidente também afirmou que os órgãos de fiscalização devem retomar a atuação na área, descontinuando o trabalho das Forças Armadas.
“Nós precisamos ter um planejamento para a recuperação da capacidade operacional dos órgãos de fiscalização, porque eles perderam pessoal por aposentadoria, estão com seus efetivos reduzidos. Nós precisamos aumentar a capacidade deles de modo a que liberemos as Forças Armadas do emprego constante em atividades as quais elas não estão, não é a atividade precípua delas”, disse o vice-presidente.
Ações do governo do Amazonas
Em nota, a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) informou que o Governo do Estado decretou situação de emergência no sul do estado e na Região Metropolitana de Manaus (RMM), em maio deste ano, a fim de antecipar o plano operativo de enfrentamento às queimadas, que tendem a ser maiores no período de estiagem, a partir de agosto, aderindo à GLO.
A Secretaria destacou também o lançamento do Plano de Prevenção e Controle ao Desmatamento e Queimadas (PPCDQ-AM), realizado no início de junho, que orienta a gestão ambiental no biênio 2020-2022 e prioriza ações de Comando e Controle, Ordenamento Territorial e estímulo à bioeconomia no estado.